domingo, 30 de maio de 2010

Horses (1975)


Enquanto trabalhava, resolvi pesquisar em uma dessas rádios online por algumas coisas que nunca tive grande oportunidade de ouvir e tive a sorte de encontrar uma preciosidade, lacuna sentida na minha modesta mas, porque não dizer, esmerada discoteca de rock: Horses (1975), de Patti Smith. A facilidade com que hoje se encontra praticamente qualquer disco, de qualquer artista, me fez lembrar das dificuldades de alguns anos atrás.

Em parte pela falta de grana, em parte pelas dificuldades de se encontrar certos artistas que raramente entravam em catálogo por estas bandas, me lembro bem da logística que se fazia para conseguir certos discos. O primeiro Frank Zappa and the Mothers of Invention me lembro de ter conseguido em uma lojinha que tinha um catálogo de importados que vinha em um livrão, semelhante a uma lista telefônica. Se fazia o pedido e se esperava, e muito. A equiparação entre Dólar e Real foi responsável por alguns dos itens mais interessantes que guardo comigo, coisas de Lou Reed, como um pirata de um show na Europa, em 1972; o primeiro do Velvet Underground, No Fun, dos Stooges e um dos meus favoritos, 4th Way Street, de Crosby, Stills Nash & Young, entre outros biscoitos finíssimos de uma certa família espiritual do rock and roll que ainda curto.

Pois não é que Horses, de Patti Smith, não está lá onde devia, perto de Lou Reed, do Television e de outras coisas que estão sempre ao alcance da mão? O dólar já subiu e já desceu e eu fui deixando. Meu encontro desta noite com esse discaço só tornou minha vida um pouco mais miserável do que de costume. Bom pessimista, me torturo pela ausência do disco em sua forma material mais do que me alegro em ouvi-lo no computador. E que disco!

Horses é com justiça considerado um dos maiores álbuns de estréia da história do rock. Logo nos primeiros minutos, Patti apresenta uma bela versão de Gloria, de Van Morrison, onde metralha: "Jesus died for somebody's sins…but not mine", e as coisas estão mal começando. Ainda que pareça uma egotrip, não tenho como não lembrar de meus tempos de adolescente e de minhas buscas por referências literárias encontradas em discos de bandas como The Doors, que me apresentou, entre outros, a William Blake e Rimbaud, ou Bob Dylan, que me serviu de estímulo para descobrir a poesia beat, em especial Ginsberg, porque essas referências estão todas lá, em cada uma das faixas do álbum.

A voz marcante de Smith ora canta vigorosamente músicas que justificam o selo de pré-punk que nela colaram, como a versão rápida e suja de My Generation, ora se arrasta recitando poesia com um fundo musical hipnótico e um pouco angustiante, lembrando grandes momentos do Velvet Underground, como em Elegie.

Tudo isso pode parecer extremamente pedante pelo quê de iniciático que tem esse papo, mas fazer o quê? Essa patota toda representa o momento áureo do pop, em que as suas referências se fundiam com poesia e filosofia de uma maneira rara e tudo isso é muito bom.

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