quinta-feira, 17 de junho de 2010

O mundo do sexo



Este é o título de um pequeno livro de Henry Miller, publicado pela José Olympio, editora que faz o grande serviço de manter o autor em catálogo com vários de seus títulos. Não raro, Miller é simplesmente jogado em meio aos autores “pornográficos”, autores de livros para ler com uma só mão. Mas a sua obra vai muito além disso.

É indiscutível que em diversas de suas obras são densas e minuciosas as descrições de sexo, em linguagem crua e direta. E, não menos importantes para os leitores mais fetichistas, a maior parte de suas obras tem caráter autobiográfico. No entanto, não é apenas de sexo que são feitas as suas páginas. Na realidade, é digno de nota o fato de ele haver escrito vários livros de ensaios, como o interessantíssimo “Pesadelo Refrigerado”, retrato pessimista dos EUA, feito por Miller depois de uma longa viagem pelo país recém chegado de uma prolongada estada em Paris.




Em O mundo do sexo, escrito após Trópico de Câncer (1934) e Trópico de Capricórnio (1939), Miller faz uma espécie de reflexão sobre a maneira com que o sexo é visto por ele e transformado em criação literária, bem como as reações mais comuns á sexualidade, em especial levando em conta o olhar de estadunidenses e franceses. Há passagens muito interessantes no que diz respeito a essa comparação, que certamente reforçam algumas das impressões mais pessimistas sobre a cultura estadunidense, em especial seu moralismo.

O sexo, para Miller, acaba por ser mais do que religião ou prazer, é um caminho para a autolibertação. Aos seus olhos, o ambiente mundano por ele frequentado nas décadas de 1920 e 1930 permitia que ele se desfizesse de amarras herdadas de sua educação e de alguns dos ideais desposados pelos “homens de bem”. Em diversos momentos ele faz o elogio das putas, dos vagabundos e dos viciados com os quais convivia em bairros barra-pesada de Paris, de alguma forma glorificando aquela forma de vida frágil e exposta, dando-lhe, como fariam mais tarde os Beats, uma forma bastante peculiar de sacralidade.

Essa espécie de mística da derrisão como uma forma de vida superior não foi bem compreendida. Demonstrou em diversas passagens da obra a sua irritação com relação aos leitores com os quais conversava sobre seu trabalho. Eles se dividiam em dois grupos: aqueles que gostavam de seus romances, em especial por conta das passagens sobre sexo, e aqueles que gostavam de seus ensaios, pela relativa ausência de carne, pela sua neutralidade. Segundo Miller: “Apenas poucas almas com discernimento parecem capazes de reconciliar os aspectos supostamente contraditórios de um ser que se esforçou para que nenhuma parte sua deixasse de aparecer em sua obra escrita”.

E essa talvez seja a principal característica da obra de Henry Miller como um todo: uma união entre vida e obra que inspirou, em muito, as gerações que cresceram com suas obras, muitas vezes em edições cladestinas ou de fundo de quintal, como uma espécie de tábua de salvação, em especial pela liberdade que delas transpirava.

Para ler um pouco de Henry Miller:

Trópico de Câncer. José Olympio, 2006.
Trópico de Capricórnio. José Olympio, 2008.
O mundo do sexo. José Olympio, 2007.
Big Sur e as laranjas de Hieronymus Bosch. José Olympio, 2006.
Dias de paz em Clichy. José Olympio, 2006.
Pesadelo refrigerado. Francis, 2005.
Sexus. Companhia das Letras, 2004.
Plexus. Companhia das Letras, 2005.
Nexus. Companhia das Letras, 2006.

3 comentários:

  1. Depois da frase "autores de livros para ler com uma só mão" não consegui continuar a leitura. hahahahaha

    beijo, professor!

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  2. Ah, professor, qual é o teu email? Não encontrei aqui.

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  3. Olá Thaís, te agradeço pelo comentário e pela visita. Gostei de saber que passaste por aqui.
    Beijos
    Éder

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